Equador: Presidente tampão, Noboa flerta com autoritarismo – 08/02/2025 – Mundo

Jovem, formado por Harvard e herdeiro de um magnata cujo império provém da venda de bananas, Daniel Noboa, 37, chegou à Presidência do Equador há 15 meses como um novato que prometia oxigenar a gestão de um país assolado pelo narcotráfico.

O centro-direitista manteve popularidade elevada e tem chances de se reeleger neste domingo (9), mas não sem controvérsias. Sua passagem pelo poder tem sido marcada por acusações de analistas, ONGs e opositores de que ele não é muito afeito às regras da democracia.

“Noboa não seguiu regras internacionais, nem regras constitucionais, nem regras eleitorais”, diz o analista Manuel Macías Balda, chefe do departamento de ciência política da Universidade de Guayaquil. “Ele se constrói como mais um dos presidentes autoritários das Américas.”

Foi uma lista ampla de irregularidades acumuladas. A começar pela mais recente, quando se recusou a se licenciar da Presidência durante sua campanha à reeleição, como dita a lei. Noboa seguiu exercendo o cargo mesmo enquanto participava de atos de campanha.

Sua equipe argumenta se tratar de um caso excepcional. Diz que como Noboa foi eleito em um pleito extraordinário, convocado de forma antecipada para alçar um governo tampão quando o ex-presidente Guillermo Lasso implodiu seu governo em 2023, e que portanto o atual líder não teria que se aferrar a essa regra.

Para Macías Balda, é mais um exemplo do malabarismo que Noboa opera com a lei. “Ele tem um grande jogo de cintura com as regras da democracia e se beneficia de o Equador ter institucionalidade frágil.”

“Ele sabe como contornar os mecanismos, às vezes no campo da legalidade, mas sempre em um campo de interpretação muito amplo.”

O presidente também declarou guerra contra sua vice, Verónica Abad, e tentou apartá-la do cargo, o que lhe rendeu acusações de machismo e discriminação. Noboa enviou Abad para ser embaixadora em Israel e na Turquia e também tentou suspendê-la do cargo, sem amplas justificativas. O tema levou a uma disputa judicial, favorável a ela.

Nos dias em que se ausentou da chefia do governo, o presidente emitiu decretos para colocar uma assistente como vice e, portanto, substituta. Nesta semana a Corte Constitucional derrubou essas medidas.

Mas Abad segue sem acesso a seu gabinete, que Noboa mandou cercar com militares, e acusa o ex-aliado de acumular poder e “arrastar o Equador para que vire uma Venezuela”.

Abad não foi a única afastada do governo. A primeira baixa da gestão foi a ministra de Energia de Noboa, Andrea Arrobo, hoje vista como bode expiatório de um problema muito maior. O presidente pediu a renúncia da aliada em meio à histórica crise energética que o país começou a atravessar no ano passado, com apagões de até 14 horas.

Arrobo chegou a ser investigada no caso. Até que divulgou carta pública na qual dizia que era ameaçada e que Noboa sabia que a energia equatoriana estava à beira do colapso.

“Se mostro ao país as conversas que tive com o presidente, nas quais o informo sobre a crise; se revelo como insisti em tornar essa uma questão pública, para que a população estivesse preparada, então minha vida e de toda a minha família estaria em jogo”, escreveu.

Os imbróglios domésticos não são isolados. No ano passado Noboa protagonizou uma das maiores tensões geopolíticas da região ao invadir a embaixada do México em Quito para prender o ex-vice-presidente Jorge Glas, oposicionista investigado por corrupção.

As embaixadas são consideradas invioláveis perante o direito internacional, com base na Convenção de Viena sobre Relações Diplomáticas, de 1961, uma das pedras fundamentais da diplomacia.

O episódio levou a enfáticas condenações de múltiplos países, o Brasil incluso, e ao rompimento das relações bilaterais com o México.

Dias antes do primeiro turno a presidente que será realizado neste domingo (9), Noboa ainda anunciou, de supetão, imposição de tarifas de 27% para todos os produtos mexicanos. Não é uma medida que afete consideravelmente a economia mexicana pela timidez da balança comercial, mas a ação do presidente não deixou de surpreender.

Outra bandeira vermelha em meio ao atual processo eleitoral foi a inabilitação do agora ex-candidato Jan Topic, um nome visto com potencial para enfrentar Noboa nas urnas.

O Tribunal Eleitoral afirmou que o empresário da área de segurança e ex-membro da Legião Estrangeira Francesa tinha conflito de interesses por supostos contratos com empresas municipais.

Um dos juízes da corte depois revelou que a decisão foi baseada em um informe confidencial da autoridade tributária, levantando suspeitas de que havia interferência do governo dada a baixa transparência.

O secretário-geral da OEA (Organização dos Estados Americanos), Luis Almagro, disse na ocasião que isso era “um duro golpe na integridade do processo eleitoral e um sério revés para a democracia equatoriana”.

O presidente é ainda acusado de negligenciar violações de direitos humanos cometidas em meio a sua estratégia de militarizar a segurança pública.

Noboa tem uma base social considerável, em especial de camadas que, cansadas e desesperançosas, apostam em seu populismo penal e linha-dura na segurança pública para mudar o rumo do país. Mas também começa a ganhar força um anti-noboísmo. “Gente que o acha abusivo, irresponsável e soberbo, por exemplo”, lista Macías Balda.