Três dias após Donald Trump se tornar presidente, o Serviço de Imigração e Controle de Alfândegas (ICE, na sigla em inglês) fez uma operação em um mercado gourmet de frutos do mar em Newark, na Nova Jersey. O ICE interrogou trabalhadores, incluindo um cidadão americano, antes de realizar três prisões.
Não está claro se os agentes tinham um mandado judicial. A operação ajudou a lançar a blitzkrieg de fiscalização de imigração prometida pelo governo Trump. Autoridades do gabinete e câmeras de TV acompanharam o ICE em outras operações; a publicidade cria dissuasão e reforça a mensagem Maga (acrônimo em inglês de “faça a América grandiosa novamente”, o slogan de Trump).
Em redutos democratas como Newark, as operações também provocam a oposição. “Você não pode simplesmente deter pessoas arbitrariamente”, diz o prefeito Ras Baraka. “Você não pode simplesmente abordar alguém sem causa provável.” Baraka enviou o procurador-geral da cidade ao mercado de frutos do mar e está trabalhando para fortalecer as respostas a outras operações não anunciadas e invasivas.
Será que Trump conseguirá cumprir sua promessa de reduzir a população não autorizada dos Estados Unidos, estimada em até 13 milhões? Invadir mercados para prender três pessoas de cada vez (duas das quais, neste caso, foram liberadas sob fiança) não é um caminho promissor.
Após a posse de Trump, o ICE relatou prisões diárias variando de 286 a 1.179. Ele prometeu mirar em migrantes com condenações ou acusações criminais. Mas é claro que, como em Newark, migrantes sem antecedentes criminais estão sendo detidos. De acordo com dados divulgados na última sexta-feira (14), esse grupo representa 14% de todos os detidos, um aumento de 6%.
Mesmo com esse aumento de não criminosos, manter uma taxa de mil prisões por dia será difícil. O ICE parou de divulgar o número de prisões diárias no início de fevereiro, o que pode indicar que a agência prefere que ninguém faça as contas.
A maioria das prisões acontece na fronteira. Essas detenções são mais fáceis e baratas, mas agora há menos imigrantes não autorizados para capturar lá. Os encontros (abordagem de agentes de imigração que pode incluir fiscalização ou detenção) na fronteira em dezembro passado foram os mais baixos desde 2021, de acordo com dados da Alfândega e Proteção de Fronteiras.
A migração irregular é afetada pela disponibilidade de empregos, pela gravidade das crises no exterior e pela dissuasão, que é o ponto forte de Trump. Mas sem um aumento de novos migrantes na fronteira sul, “não dá para imaginar aonde [o governo Trump] iria para capturar um grande número de pessoas não autorizadas”, diz Muzaffar Chishti, do think tank Migration Policy Institute.
Sem um mandado ou consentimento, os agentes da lei são limitados ao investigar dentro dos EUA. Eles só podem entrar em espaços públicos e áreas públicas de empresas privadas, como estacionamentos ou saguões. Eles devem então determinar quem é um imigrante sem documentos, o que pode ser complicado. A polícia não pode entrar em uma sala aleatória e revistar todos em busca de identificação, observa Michael Kagan, professor de direito da Universidade de Nevada.
Grandes operações são frequentemente ineficientes, diz Chishti, como mostra o caso de Newark. Uma operação de fiscalização mais extravagante no Bronx em 28 de janeiro resultou em ainda menos prisões. Apesar de Kristi Noem, a secretária de Segurança Interna, vestir um colete à prova de balas para se juntar ao ICE e depois postar um vídeo no X, todo o espetáculo resultou na prisão de um único imigrante sem documentos procurado pelas autoridades em Nova York.
É muito mais fácil prender migrantes que já estão detidos. Mas isso requer que a liderança de uma prisão colabore, e as chamadas leis de santuário limitam a cooperação com o ICE em muitos estados e cidades democratas. Isso frustrou Trump durante seu primeiro mandato e pode constrangê-lo novamente (embora em Nova York, uma cidade santuário, o prefeito Eric Adams tenha dado permissão ao ICE para abrir um escritório em Rikers Island, sua maior prisão).
Um problema urgente é a capacidade. “Estamos muito, muito perto de ter tantas pessoas detidas quanto o número de vagas de detenção”, diz Amy Torres, chefe da Aliança de Nova Jersey para a Justiça dos Imigrantes, um grupo ativista. Em 9 de fevereiro, a população total detida pelo ICE atingiu 41.169, um pouco abaixo da capacidade do sistema de 41.500.
Em 29 de janeiro, Noem anunciou que o governo Trump revogou as proteções temporárias contra deportação concedidas a cerca de 600 mil venezuelanos nos EUA. Este grupo pode ser mais fácil de localizar e deportar, mas grandes operações exigiriam mais instalações de detenção.
Trump diz que tem um plano para isso. Ele emitiu um decreto para aumentar a quantidade de vagas para imigrantes na base naval da baía de Guantánamo, destinadas “a criminosos estrangeiros de alta prioridade presentes ilegalmente nos Estados Unidos”. Vários voos já transportaram detidos de El Paso. Mas Guantánamo tem uma capacidade estimada de 30 mil pessoas. Ele precisará de muitos mais desses campos se o governo quiser cumprir sua retórica de campanha de deportar mais de 10 milhões de pessoas.
Texto da The Economist, traduzido por Lucas Alonso, publicado sob licença. O artigo original, em inglês, pode ser encontrado em www.economist.com