Uma operação militar de Israel que durou semanas em várias cidades da Cisjordânia deslocou cerca de 40 mil palestinos de suas casas, no que historiadores e pesquisadores dizem ser o maior deslocamento de civis no território desde a guerra árabe-israelense de 1967.
Campanhas israelenses contra grupos armados palestinos em três partes do norte da Cisjordânia forçaram milhares de moradores a buscar abrigo com amigos e parentes, ou acampar em salões de casamento, escolas, mesquitas, prédios municipais e até mesmo em um galpão de fazenda.
O Exército israelense afirma que a operação é apenas uma tentativa de sufocar grupos combatentes em Jenin, Tulkarem e perto de Tubas, visando homens armados que, segundo eles, realizaram ou estão planejando ataques terroristas contra civis israelenses.
Os palestinos temem que seja uma tentativa velada de deslocá-los permanentemente de suas casas e exercer maior controle sobre áreas administradas pela Autoridade Palestina, um órgão semiautônomo que também tem combatido grupos armados nos últimos meses.
Muitos dos deslocados são descendentes de refugiados que foram expulsos ou fugiram de suas casas durante as guerras em torno da criação do Estado de Israel em 1948, um período conhecido em árabe como a Nakba (catástrofe). O deslocamento renovado, mesmo que temporário, traz dolorosas memórias do trauma central na história palestina.
Embora cerca de 3.000 moradores tenham retornado a suas casas, a maioria permanece sem teto após mais de três semanas —um deslocamento maior do que o realizado durante uma campanha israelense semelhante na Cisjordânia em 2002, de acordo com quatro especialistas (dois palestinos e dois israelenses) na história da Cisjordânia. Naquele ano, soldados invadiram várias cidades no auge de uma revolta palestina, conhecida como a segunda intifada, que começou com protestos antes de levar a um aumento nos ataques palestinos contra civis em Israel.
Os números atuais também superam o deslocamento durante confrontos internos no início deste ano, quando até mil moradores de Jenin deixaram suas casas, segundo um conselho de liderança local.
Como em 2002, alguns dos deslocados durante essa nova campanha não terão casa para retornar. O Exército de Israel demoliu dezenas de edifícios nas áreas que invadiu, destruindo estradas, tubulações de água e linhas de energia para destruir o que dizem ser armadilhas explosivas colocadas por combatentes.
O Escritório das Nações Unidas para a Coordenação de Assuntos Humanitários disse que sistemas de água e saneamento foram destruídos em quatro bairros urbanos densos, conhecidos como campos de refugiados porque abrigam pessoas deslocadas em 1948 e seus descendentes. Acrescentou que parte da infraestrutura de água foi contaminada com esgoto.
“Chegamos a um ponto em que os campos de refugiados estão fora de ordem”, disse Hakeem Abu Safiye, que supervisiona os serviços de emergência no campo de Tulkarem. “Eles são inabitáveis. Mesmo que o Exército se retire, não temos certeza do que restará para reparar.”
A escala total dos danos é incerta porque o Exército ainda está operando na maioria das áreas que invadiu, mas a ONU já registrou danos severos em mais de 150 casas em Jenin. No início de fevereiro, Israel havia reconhecido a explosão de pelo menos 23 edifícios, mas se recusou a confirmar o número mais recente de estruturas demolidas.
“Os soldados estão tomando uma área após a outra, destruindo casas, infraestrutura e estradas”, disse Ramy Abu Siriye, 53, um barbeiro forçado a fugir de sua casa em Tulkarem em 27 de janeiro, o primeiro dia da operação de Tel Aviv.
“Os israelenses têm dois objetivos. Primeiro, empurrar os refugiados do norte da Cisjordânia para as áreas centrais, visando apagar completamente os campos de refugiados”, disse Abu Siriye. “O segundo objetivo é eliminar a resistência e enfraquecer a capacidade da Autoridade Palestina de governar.”
Um porta-voz do Exército israelense, Nadav Shoshani, disse que o objetivo era erradicar grupos combatentes, incluindo o Hamas, que lançam ataques terroristas contra civis israelenses. “O propósito das operações é prevenir o terror de lugares a poucos quilômetros de comunidades judaicas e evitar uma repetição de 7 de Outubro”, disse Shoshani, referindo-se ao ataque liderado pelo Hamas em Israel que matou cerca de 1.200 pessoas e levou ao sequestro de outras 250 pessoas.
Shoshani reconheceu que em alguns casos as pessoas receberam ordens de deixar edifícios específicos próximos ao que ele disse serem esconderijos de combatentes. Mas, de forma mais geral, Shoshani negou qualquer política mais ampla de “retirada forçada ou deslocamento de palestinos”.
“Se as pessoas quiserem se mover, obviamente estão autorizadas a fazê-lo”, acrescentou. Cerca de 3.000 pessoas conseguiram retornar ao campo de al-Faraa, perto de Tubas.
Mas palestinos deslocados disseram que tanto em Jenin quanto em Tulkarem foram instruídos a sair por soldados que usaram alto-falantes para fazer ordens gerais de retirada.
“Tivemos que deixar o campo, o Exército ameaçou atirar em nós”, disse Aws Khader, 29, dono de um supermercado que fugiu de Tulkarem em 27 de janeiro. “Eles usaram megafones, ordenando que as pessoas saíssem ou seriam baleadas.”
Questionado sobre este e incidentes semelhantes, o Exército repetiu em um comunicado que nenhuma ordem de retirada foi emitida, mas que todos os que desejassem sair receberam passagem segura. O comunicado diz que as tropas operaram no bairro de Khader porque “descobriram infraestrutura terrorista e armas que terroristas haviam escondido em uma livraria”.
Os palestinos rejeitam as explicações do Exército, citando apelos de ministros extremistas no governo de Israel para encorajar a fuga de palestinos da Cisjordânia, destruir a Autoridade Palestina e anexar o território.