O presidente da Colômbia, Gustavo Petro, disse em uma reunião de seu gabinete que “a cocaína não é pior do que uísque”, em um momento em que a produção de coca, ingrediente base da droga, aumenta sob sua Presidência.
Ex-membro de um grupo guerrilheiro de esquerda que já chamou a guerra às drogas liderada pelos Estados Unidos de fracasso, Petro declarou ainda a seus ministros e secretários que a cocaína —da qual a Colômbia é de longe o maior produtor— só é ilegal “porque é feita na América Latina”.
“O negócio poderia ser facilmente desmantelado se a cocaína fosse legalizada em todo o mundo”, disse Petro durante a caótica sessão televisionada de terça (4) à noite. “Venderia como vinho.”
Os comentários de Petro provavelmente vão causar surpresa em Washington, dias depois de Colômbia e EUA evitarem por pouco uma guerra comercial devido à recusa inicial de Petro em receber deportados colombianos algemados em aeronaves militares dos EUA.
O presidente americano, Donald Trump, também adotou uma postura firme contra o tráfico de drogas, fazendo ameaças ao México desde sua posse sobre o comércio de narcóticos, especialmente o opioide sintético fentanil, na fronteira dos EUA.
Na Colômbia, a área usada para o cultivo de coca cresceu 10%, para 253 mil hectares, em 2023, o primeiro ano completo do mandato de Petro e o ano mais recente para o qual há dados disponíveis, de acordo com o Escritório das Nações Unidas sobre Drogas e Crime. A produção potencial de cocaína —a quantidade que poderia ser fabricada se todas as folhas de coca fossem colhidas— aumentou 53%, para 2.664 toneladas.
Seu governo reduziu drasticamente as operações militares e policiais que visam os produtores de coca, priorizando as apreensões de remessas de drogas no mar.
Pedro Piedrahita Bustamante, professor de ciência política na universidade Tecnológico de Antioquia, disse que os comentários de Petro refletem sua posição de que as políticas tradicionais de combate às drogas falharam em conter o tráfico e abordar os problemas de saúde pública. Segundo o especialista, as medidas do presidente “têm visto muitos fracassos, especialmente na luta contra essas redes criminosas que estão presentes em vários territórios de nosso país”.
Petro falou pouco durante a reunião do gabinete sobre a crise na região nordeste de Catatumbo, na Colômbia, onde grupos rebeldes envolvidos no tráfico de drogas deslocaram mais de 50 mil pessoas nas últimas semanas.
A reunião, transmitida pela TV pública, rapidamente se transformou em caos quando três membros do gabinete, incluindo a vice-presidente Francia Márquez, criticaram seu chefe por trazer o veterano operador político Armando Benedetti como chefe de gabinete.
Também criticada foi Laura Sarabia, uma confidente de 30 anos do presidente que foi nomeada ministra das Relações Exteriores na semana passada, apesar de não ter experiência em política externa.
Benedetti e Sarabia estavam no centro de um escândalo governamental conhecido como “nannygate”, envolvendo escutas telefônicas, financiamento de campanha ilícito e uma maleta de dinheiro desaparecida. Ambos negaram irregularidades.
Jorge Rojas, chefe do departamento administrativo da Presidência, renunciou na manhã de quarta (5), tendo assumido o cargo deixado por Sarabia na semana passada. O ministro da Cultura, Juan David Correa, também deixou o cargo. O titular do Interior, Juan Fernando Cristo, disse em um post na rede social X que o gabinete era “insustentável” e propôs que a equipe ministerial renunciasse em massa.
Petro disse em um post no Instagram que as brigas eram resultado de alguns de seus ministros tentando se posicionar antes das eleições de 2026. A Constituição da Colômbia veta a reeleição.
Nicholas Watson, diretor administrativo da América Latina na consultoria Teneo, disse em uma nota na quarta: “Se a ideia de transmitir a reunião do gabinete foi concebida como uma maneira de mostrar Petro como tranquilo em relação à crise com os EUA sobre tarifas que ele desencadeou em 26 de janeiro, isso falhou espetacularmente.”
Watson acrescentou: “Petro não conseguiu evitar que a reunião se transformasse em um desabafo de recriminações que reflete mal sobre sua liderança e administração.”