Os Centros de Controle e Prevenção de Doenças (CDC), dos Estados Unidos, estão tentando retirar todos os artigos envolvendo seus pesquisadores que estejam sendo considerados para publicação por revistas científicas. A ideia é recolher o material para que a gestão Donald Trump possa revisá-lo, afirmou um funcionário do governo federal à Reuters.
A ordem foi dada pelo chefe de ciência do CDC na última sexta-feira (31). A medida foi enviada por email a todos os chefes de divisão da agência, segundo o funcionário, que viu a o texto —ele não estava autorizado a discutir o assunto publicamente.
A revisão tem como objetivo cumprir a ordem executiva de Trump de que o governo federal reconhecerá apenas os sexos masculino e feminino. Procurado, o Departamento de Saúde e Serviços Humanos (HSS) não se manifestou.
A ordem, inicialmente relatada pelo Inside Medicine Substack, vai além de uma diretiva inicial em 21 de janeiro para que as agências federais de saúde interrompessem suas próprias comunicações públicas para permitir uma revisão desses materiais por nomeados de Trump.
O Inside Medicine publicou uma lista de palavras específicas visadas para remoção na revisão das comunicações, incluindo gênero, transexual, LGBT (lésbicas, gays, bissexuais e transexuais) e não binário. O funcionário do governo disse que a lista foi enviada do CDC para suas divisões.
A ordem de sexta-feira envolve todos os manuscritos escritos ou coescritos por cientistas do CDC. Se os cientistas do CDC forem coautores de um artigo que teve origem fora da agência, eles são solicitados a retirar seus nomes do trabalho.
Especialistas em saúde pública disseram que a remoção desses termos ameaça a capacidade deles de atender a todos os tipos de necessidades médicas, pois afetam diferentes grupos, incluindo aqueles com HIV e doenças sexualmente transmissíveis.
“Não podemos simplesmente apagar ou ignorar certas populações quando se trata de prevenir, tratar ou pesquisar doenças infecciosas como o HIV. Certamente espero que essa não seja a intenção dessas ordens”, disse Carl Schmid, diretor-executivo do Instituto de Política sobre HIV e Hepatite.
Editores de revistas científicas, incluindo o periódico American Journal of Public Health, questionaram a legalidade da medida. Para artigos científicos que foram aceitos por uma revista, porém ainda não foram publicados, “nós temos os direitos autorais, o autor não pode mais fazer alterações”, disse Alfredo Morabia, editor-chefe do AJPH.
Para artigos em revisão, mas ainda não aceitos por uma revista, “é necessária uma resposta coletiva dos editores de revistas”.
“Parece incrível que isso seja compatível com a Primeira Emenda. Um direito constitucional foi cancelado”, afirmou ele. “Como o governo pode decidir quais palavras uma revista pode usar para descrever uma realidade científica? Essa realidade precisa ser nomeada.”
“Isso é uma atrocidade”, disse Carlos Del Rio, editor-chefe da seção de HIV/AIDS do NEJM Journal Watch Infectious Diseases, em um email. “Cientistas do CDC publicam todo ano trabalhos importantes que informam o campo da saúde pública. Parar as publicações nunca é bom.”
Na sexta-feira, o CDC e outras agências de saúde dos EUA retiraram do ar páginas sobre estatísticas de HIV e um banco de dados que rastreia comportamentos que aumentam os riscos à saúde dos jovens, entre outras informações, para cumprir as ordens da administração Trump sobre identidade de gênero e diversidade, levantando preocupações entre médicos e defensores dos pacientes sobre censura.